Amar e ser amado

Por Dom Alberto Taveira Corrêa, Arcebispo Metropolitano de Belém do Pará

A Páscoa é como que aniversário de Batismo de cada cristão! Para celebrá-la bem, nas semanas que correm os cristãos foram ao encontro de uma Mulher Samaritana, seus familiares e concidadãos, e descobriram aquele que é a fonte de água viva que jorra para a vida eterna. Todos foram apresentados ao Cego de nascença, com seus pais e amigos, impressionados porque seus olhos foram abertos por Jesus. Ele é Luz do Mundo e o Batismo, também chamado de Iluminação, abre perspectivas inusitadas, cujo nome é fé!

Agora, visitamos Betânia, cujo nome significa “Casa do Pobre” ou “Casa da aflição”, mas para Jesus e seus discípulos é “Casa de amizade”. Lázaro está morto (Jo 11, 1-45). É uma situação trágica, pois morreu nada menos do que um amigo de Jesus, e amizade é coisa séria.

A morte assusta, mesmo quando chegamos a nos acostumar, pois em nosso tempo é noticiada dia a dia, como um fato a mais, sem muito mistério ou sacralidade! Para Jesus, seus apóstolos e os amigos de Betânia, as coisas são diferentes. Marta que reclama pelo atraso de Jesus expressa nossa reação diante da morte de uma pessoa amada. O choro de Jesus pelo amigo morto é choro de Deus pela morte presente na humanidade e diante da própria morte que se aproxima. A Salvação que Ele traz deve tocar no mais fundo da realidade humana e, quando faz seu amigo voltar à vida, Jesus anuncia a completa libertação da morte. Existe esperança!

Vale a pena acompanhar! O relato evangélico passa, num maravilhoso crescendo, da narração da doença à morte e sepultura e o retorno à vida do amigo Lázaro, cujo nome quer dizer ‘Javé ajuda’. Transparece a humanidade cheia de ternura de Jesus, com emoção, lágrimas, declaração de amizade e revelação do Filho de Deus. Depois da profissão de fé feita por Marta, a resposta de Jesus é promessa de vida: “Quem crê em mim, ainda que tenha morrido, viverá. E todo aquele que vive e crê em mim, não morrerá jamais” (Jo 11, 25-26).

Diante do sepulcro de seu amigo Lázaro, Jesus, que antes teve seu rosto banhado em lágrimas, proclama ser Ressurreição e Vida. Mas sabemos que Ele deverá entrar no sepulcro da morte, ser envolto em faixas como seu amigo Lázaro e ressuscitar ao terceiro dia. Cristo é para todos os homens e mulheres, feridos de morte pelo pecado, Ressurreição e Vida! Saímos do velório de Lázaro, ouvimos o grito de Jesus a todos os lázaros da história, passamos pelos passos da Paixão para amanhecer no Jardim da Ressurreição.

Jesus cultivou bonitas e sadias amizades! Afinal, um amigo bom e fiel (Cf. Eclo 6, 15-17) vale mais do que um tesouro. Marta, a dona da casa, Maria, sua irmã, a mulher da escuta e dos gestos de carinho, e Lázaro, o irmão que era amigo do peito e, enfermo, veio a morrer. Naquela casa, Jesus chorou! Rosto de alguém que chora costuma ser mais bonito do que uma gargalhada!

Em Betânia, aprendemos a estrada da liberdade interior, o relacionamento sadio, a amizade autêntica, expressão da afetividade equilibrada. Quem melhor para conduzir-nos na estrada da vida segundo o Espírito (Cf. Rm 8,9) do que aquela que ouviu palavras tão fortes e determinantes, que deram rumo à sua existência, a Virgem Maria? De fato, mais do que Maria de Betânia, Maria de Nazaré “escolheu a melhor parte”, e esta não lhe foi tirada! (Cf. Lc 10, 42).

O relacionamento mais importante de Jesus é com o Pai e o Espírito Santo! Seus momentos de oração expressam a vida íntima da Santíssima Trindade. Seus afetos são de doação de vida, nunca de apoio ou cobranças! É bom perceber que, na História da Salvação, purifica-se pouco a pouco a compreensão do plano de Deus. A plenitude só chegou com Jesus Cristo, Palavra Eterna do Pai, que se fez carne no meio de nós e, até o fim dos tempos, será o Espírito Santo que nos revelará todas as coisas. O Filho assume a missão, para visitar todas as realidades humanas, indo até o mais profundo de tudo o que significa fruto do pecado, para redimir! (Cf. Ef 4, 10) Por puro amor ele entrou nas profundezas da humanidade e, quando tocou inclusive o abandono, experimentou a ausência de Deus, em nome de todas as pessoas que vivem a distância da graça de Deus, para resgatar a humanidade escrava do pecado e elevá-la, proclamando “Em tuas mãos entrego o meu espírito” (Lc 23, 46). É a maior prova de amor: “Ninguém tem amor maior do que aquele que dá a vida por seus amigos. Vós sois meus amigos, se fizerdes o que eu vos mando” (Jo 15, 12-13).

Depois, sua Mãe, a Virgem Maria, foi certamente a pessoa de maior proximidade e intimidade com Jesus. Com ela, na Casa de Nazaré, também São José. Podemos pensar no trato que Jesus, Filho do Carpinteiro, e ele mesmo Carpinteiro, teve com tantas pessoas. Quando irrompe na vida pública, nós o vemos chamando e formando discípulos. A diversidade do grupo chama atenção porque acolhe gente “de todo tipo”. É que ele ama, e pronto! Alarga-se o círculo com um grupo muito simpático de mulheres: Maria Madalena, Joana, Susana, e muitas outras mulheres, que os ajudavam com seus bens (Cf. Lc 8, 1-3). Na Paixão, Morte e Ressurreição, lá estavam elas, olhando de longe: Madalena, Maria, mãe de Tiago Menor e de Joset, e Salomé (Cf. Mc 15, 40-41). E foram testemunhas da Ressurreição! (Mc 16, 1-8). O número de amigos aumenta pela história afora e assim será, até a volta do Senhor. A Igreja cresce por testemunho, convivência, amizade, “contágio” positivo e frutuoso.

A amizade com Marta, Maria e Lázaro expressa sua humanidade e o relacionamento sadio com as pessoas. E chegam os pobres, enfermos, pecadores, todos entram em contato com Jesus. Não se deixa “possuir”, continua com liberdade o seu caminho, não cede às tentações e provocações do poder, é Rei, mas seu Reino não é daqui!

E o Senhor Jesus ofereceu o mandamento do amor, garantiu sua presença (Mt 18, 20) entre aqueles que se reúnem em seu nome, plantou a vida na Igreja como comunhão fraterna, enviou discípulos dois a dois! Os Atos dos Apóstolos testemunham como começaram a viver os primeiros cristãos e como haveremos de viver até a volta do Senhor. “Ele está no meio de nós”, repetimos tantas vezes!

O equilíbrio e o respeito no relacionamento entre as pessoas, as diversas experiências de comunhão, o exercício da caridade, tudo é oferecido para que o mundo creia: “Assim como tu me enviaste ao mundo, eu também os enviei ao mundo… Que todos sejam um, como tu, Pai, estás em mim, e eu em ti. Que eles estejam em nós, a fim de que o mundo creia que tu me enviaste” (Jo 17, 18-21).