A Igreja e a unidade

Por Cardeal Orani João Tempesta, Arcebispo de São Sebastião do Rio de Janeiro (RJ)

No dia 9 de novembro, a Igreja celebra a festa, o aniversário, da dedicação da Basílica de Latrão, a Catedral do Papa, Bispo de Roma, chamada “a primeira entre todas as Igrejas; ou seja, a Igreja-mãe de Roma”. Surgiu no século IV e é dedicada ao Divino Salvador. Foi levantada, em Roma, pelo imperador Constantino. A festa é celebrada em toda a Igreja como o sinal de unidade com o Papa. Após a paz constantiniana se tornou a moradia do Papa. Numerosos e importantes concílios ecumênicos tiveram lugar nela. A dedicação daquela Basílica marcou a passagem e a saída da assembleia cristã, do interior das catacumbas para o esplendor das basílicas.

A Igreja de Roma (isto é, a Arquidiocese de Roma) é a Igreja de Pedro e de Paulo, é a Igreja que preside à todas as outras dioceses do mundo, é a mais venerável de todas as Igrejas da terra. Santo Inácio de Antioquia referia-se a ela, lá pelo ano 97, com indizível veneração. Numa carta que endereçou aos cristãos romanos, o santo Bispo de Antioquia escrevia: “À Igreja objeto de misericórdia na magnificência do Pai altíssimo e de Jesus Cristo seu único Filho, amada e iluminada na vontade daquele que conduz à realização todas as coisas que existem, segundo a fé e o amor de Jesus Cristo nosso Deus, à mesma que também preside na região dos romanos, digna de Deus, digna de honra, digna da máxima beatitude, digna de louvor, digna de sucesso, digna de pureza e colocada acima das demais na caridade, que possui a lei de Cristo e o nome do Pai”.

O Papa, como Bispo de Roma, é cabeça do Colégio dos Bispos e sinal visível da unidade da Igreja na fé e na caridade. É por isso que hoje nos unimos à Igreja de Roma na festa da Dedicação, da consagração da sua Catedral, a basílica do Latrão. A Catedral de cada diocese é a Igreja do Bispo, sucessor dos Apóstolos. Quanto mais importante é a Catedral do Bispo de Roma, sucessor de Pedro. Por isso, ela é considerada a “Mãe de todas as Igrejas da Cidade e do mundo”. Assim sendo, essa festa convida-nos também a rezar pela Igreja de Deus que está em Roma e pelo seu Bispo, Papa Francisco. Convida-nos a estreitar nossos laços com Roma e o Papa, retomando nossa consciência do papel que ele tem como Vigário de Pedro, a quem Cristo confiou sua Igreja.

Num mundo tão complexo, com tantas ideias, opiniões e modas, num cristianismo que vê surgir tantos grupos religiosos diversos reafirmemos nossa comunhão firme, profunda e convicta com a Igreja de Roma e seu Bispo, a quem o Cristo entregou de modo particular as chaves do Reino e deu a missão de confirmar na fé os irmãos. A comunhão com Roma é garantia de estar naquela comunhão que Cristo sonhou para a sua Igreja; é garantia de permanecer na fé apostólica, transmitida uma vez por todas, é garantia de não cair num tipo de cristianismo alheio àquilo que o Senhor Jesus pensou e estabeleceu.

As Igrejas são o lugar de reunião dos membros do novo Povo de Deus, que se congregam para rezar juntos. Mas são sobretudo o lugar em que encontramos Jesus, real e substancialmente presente na Sagrada Eucaristia; está presente com a sua Divindade e com a sua Santíssima Humanidade, com o seu Corpo e a sua Alma. “Ali nos vê e nos ouve, e nos socorre como socorria aqueles que chegavam, necessitados, de todas as cidade e aldeias” (Mc 6,32).

O templo sempre foi considerado entre os judeus como lugar de uma particular presença de Deus. No deserto, Deus manifestava-se na Tenda do encontro, onde Moisés falava com o Senhor, como se fala com um amigo; nesses instantes, a coluna de nuvem – sinal da presença divina – descia e detinha-se à entrada da Tenda (Ex 33,7-11). Era o lugar onde estará presente o meu Nome, o Ser infinito e inefável, para escutar e atender os seus fiéis. Quando Salomão construiu o Templo de Jerusalém, pronunciou estas palavras na festa da sua dedicação: “É possível que Deus habite verdadeiramente sobre a Terra? Porque se o céu e os céus dos céus não te podem conter, quanto menos esta casa que eu edifiquei! Mas atende Senhor meu Deus, à oração do Teu servo e às suas súplicas; ouve o hino e a oração que o teu servo faz hoje na Tua presença, para que os teus olhos estejam abertos noite e dia sobre esta casa, da qual disseste: “O meu nome estará nela”, Israel, em tudo o que te pedirem neste lugar; sim, tu a ouvirás do lugar da tua morada no céu” (1Rs 8,27-30).

Contudo, a Igreja é a Comunidade: “Vós sois a construção de Deus. Acaso não sabeis que sois santuário de deus e que o Espírito de Deus mora em vós? O santuário de Deus é santo, e vós sois esse santuário!” Nossos templos são chamados de “igreja” porque são casas da Igreja, espaço sagrado no qual a Igreja-Comunidade se reúne num só Espírito Santo para, unida ao Filho Jesus, elevar o louvor de glória ao Pai, sobretudo na Eucaristia. Assim, celebrar a dedicação de uma igreja-templo é recordar que nós somos Igreja-Comunidade, Corpo de Cristo, templo verdadeiro de Deus, pleno do Espírito Santo. Santo Agostinho recordava: “A dedicação da casa de oração é festa da nossa comunidade. Mas, nós mesmos somos a Casa de Deus. Somos construídos neste mundo e seremos solenemente dedicados no fim dos tempos!” Nós – cada um de nós – somos pedras vivas, pedras vivificadas pelo Espírito, para formarmos um só edifício espiritual, isto é, um edifício no Espírito Santo.

Na unidade com o Bispo de Roma na festa da dedicação da Catedral de São João de Latrão, vivamos a nossa comunhão importante e necessária para que continuemos a evangelizar com convicção. Para que o mundo creia, “que todos sejam um”.