papaMudanças nos processos de nulidade: esperança e não temor

Por Rádio Vaticano

A reforma no processo matrimonial com o Motu Proprio de 8 de setembro passado, a relação com os dois Sínodos sobre matrimonio e família, a agilização e a simplificação desejada pelos bispos de todo o mundo, a centralidade do bispo-juiz, a reavaliação do direito do metropolita. Estes foram os temas tratados pelo Decano da Rota Romana (na foto, o Papa na abertura do Ano Judiciário do Tribunal da Rota Romana, em 23/1/2015), Dom Pio Vito Pinto, um mês após a promulgação dos dois documentos que entrarão em vigor em 8 de dezembro, início do Jubileu da Misericórdia, em uma entrevista ao L’Osservatore Romano. Trata-se de uma profunda reforma, que já nestes primeiros dias dos trabalhos sinodais foi aclamada – sublinha o prelado – como uma lei clara, disposta para responder às necessidades urgentes dos fieis e da qual o Papa espera que traga esperança, não medo.

– É possível estabelecer uma relação entre os dois documentos papais e o Sínodo?

“Os dois Motu proprio são fruto do caminho sinodal e expressão autêntica da colegialidade episcopal. Como é sabido, houve de fato, antes das duas assembleias sinodais, uma ampla consulta. Os documentos nascem, portanto, de uma ampla experiência colegial, surgida dos questionários enviados a todas as conferências episcopais. E disto resultou uma ampla convergência sobre a exigência de agilizar e simplificar os processos matrimoniais, como sublinha o numero 115 do Instrumentum laboris e disseram os Cardeais Baldisseri e Erdö nos respectivos pronunciamentos de abertura do Sínodo”.

– Agilizar e simplificar os processos: o que significa isto concretamente?

“Como já havia disposto Pio X no início do século XX, o Pontífice quis restituir plenamente o exercício do poder judicial ao bispo diocesano e ao metropolita, isto é, ao Arcebispo chefe de uma Província Eclesiástica. Deste modo o Papa Francisco quis uma maior proximidade das estruturas da Igreja aos fiéis”.

– Quais são os alicerces destas novas leis?

“A reforma do Papa Francisco confia a cada bispo diocesano dois tipos de processo: o mais breve e aquele ordinário. No primeiro caso, é o bispo que julga pessoalmente, se existe plena evidencia das provas de nulidade; neste caso, após uma breve instrução, assume a certeza moral e assina a sentença. Não é todavia o bispo a instruir a causa, mas os seus colaboradores: o Vigário Judicial ou outro juiz instrutor. Se, pelo contrario, não existe uma imediata evidência das provas, o caso é enviado ao processo ordinário. Por este motivo cada bispo deve constituir um Tribunal Diocesano para as nulidades matrimoniais: colegial, mas no caso de impossibilidade também com um juiz único. Concretamente, cada pedido de nulidade deve ser dirigido ao Vigário judicial diocesano, que decide em qual dos dois tipos de processo o caso deve ser resolvido. O processo breve prevê a possível presença das partes, diferentemente do processo ordinário, e deve resolver-se num espaço de tempo que pode oscilar de duas semanas a um mês. Aspectos estes, que mostram a grande novidade deste tipo de procedimento, não por acaso confiado pelo sucessor de Pedro à pessoa do bispo, para que estes não caiam em abusos em detrimento da verdade do vinculo matrimonial: abusando, de fato, o bispo trairia não ao Papa, mas ao próprio Cristo. E para ambos os processos a gratuidade, fortemente desejada pelos Motu proprio, mostrará com toda evidência o seu espirito pastoral, voltado unicamente ao bem dos fieis. E estes compreendem imediatamente o espírito de pobreza que deve inspirar a Igreja”.

– As leis tem efeito retroativo?

“Como é sabido, o novo regime jurídico entrara em vigor a partir de 8 de dezembro próximo e não terá efeito retroativo. Todavia, no caso de um processo já em andamento e cuja sentença de nulidade seja dada e notificada sucessivamente em 8 de dezembro, se aplicarão os efeitos da reforma e a sentença afirmativa será aquela definitiva”.

– O que acontecerá aos Tribunais Regionais?

“Esta lei modifica e reordena a título pleno, ex integro, o processo matrimonial, dando ao bispo o direito de constituir o seu Tribunal Diocesano. Cai, portanto, a lei que prevê os Tribunais Regionais, existentes somente em alguns países. Dentro de cada Província Eclesiástica os bispos terão, pelo contrário, faculdade de instituir, se considerarem útil, um Tribunal Interdiocesano com apelo ao Tribunal do Metropolita, com possibilidade de criar, a norma de direito, Tribunais Interdiocesanos em mais Províncias”.

– Como expressar o significado desta centralidade do bispo-juiz?

“Respondo com um exemplo. Em algumas circunstâncias particulares, o bispo, como pastor e juiz de seu rebanho, poderia entregar pessoalmente a sentença de nulidade às partes interessadas. Seria um sinal de proximidade evangélica aos fieis, em muitos casos feridos por anos de sofrimento. A Igreja, de fato, é mistério e o bispo é aquele que acompanha, quase que conduz pela mãos os fieis: neste sentido é mistagogo, como foram Basílio e Joao Crisóstomo, no Oriente, Ambrósio e Agostinho no Ocidente”.